Entrevista a Bea Bieites

existe umha demanda real de famílias que querem garantir que o trabalho feito em casa nom se veja atropelado noutras instituiçons educativas

A Semente é umha peça dentro do movimento de construçom nacional, e nom faria sentido se nom houvesse outras peças.

A nossa intençom, portanto, nom é outra que assumir a semântica dos movimentos populares.

Nos últimos anos, o projecto Semente de ensino galego tem-se convertido numha das iniciativas mais prometedoras para a sobrevivência e recuperaçom da língua. E isso embora a falta de apoios institucionais e de grande parte do nacionalismo galego, que olha para estes centros com umha mistura de desconfiança e, provavelmente, desconhecimento. Para conhecer algo mais sobre as perspectivas de futuro, falamos com Bea Bieites, membro da comunidade criada à volta da Semente de Compostela. 

Duas Sementes em Compostela, uma em Trasancos, uma em Lugo e outra em Vigo, o projecto paralelo das Babás, o das Sementinhas… Tudo em sete anos. 

Na realidade, em Compostela hai dous centros — e vai haber três —, mas só pola impossibilidade técnica de arranjar um local maior. O nosso próximo reto é unificar todos os grupos. Quanto às Babás, nom é umha questom diretamente gerida pola Semente; o que fazemos aqui é pôr famílias que necessitam cuidadoras em contacto com cuidadoras que de algumha maneira a Semente garante que respeitam a língua e os princípios educativos que nos regem a nós. Trata-se mais bem dumha facilitaçom, por assim dizer. E quanto às Sementinhas, estám pensadas como um espaço de encontro aberto a famílias que, por questom de idade sobretudo, ainda nom fam parte da Semente — a idade mínima para entrar no projecto som os dous anos. Portanto, para crianças mais pequenas, facilitamos um ponto de encontro onde expressar-se na nossa língua, familiarizar-se com as instalaçons e conhecer outras famílias em situaçom similar. 

O projecto cresce. Por que? Que oferece de diferente e interessante?

É verdade que há um crescimento. Em Compostela é o sexto ano que funciona e sempre fomos multiplicando o número crianças: o ano passado houvo 48, quase o duplo que o ano anterior. No resto das Sementes, a tendência é, com mais ou menos velocidade, a mesma. E agora mesmo hai já dous grupos de trabalho para tentar abrir Sementes no próximo ano ou no seguinte no Vale da Amaía e na Corunha. O motivo principal deste crescimento é que existe umha demanda real de famílias que querem assegurar que a educaçom da suas crianças é em galego e garantir que, quando menos nos primeiros anos de vida, o trabalho feito em casa nom se veja atropelado noutras instituiçons educativas. É verdade que também existe demanda dumha educaçom mais respeitosa com o ritmo das crianças, mais contextualizada na contorna própria, etc. E também hai umha série de público da Semente que é activista, que fai parte do tecido social do país nos diferentes níveis e que quer prolongar esse activismo também ao âmbito educativo. 

Laicismo, coeducaçom, interacçom com a natureza, autoregulaçom das crianças, assemblearismo, etc. som conceitos em destaque na Semente, mas nom som fórmulas mui difundidas no resto de modelos educativos. Nom se trata só de imersom linguística, daquela?

É verdade que a imersom linguística é a razom de ser da Semente. Isto é inegável. Em origem, a decisom de criar a Semente foi tomada numha assembleia geral da Gentalha do Pichel na que se debateu sobre se era melhor abrir mais um centro social ou se havia capacidade para iniciar um projecto educativo. Optou-se por esta segunda via — com todo o acerto, segundo a minha opiniom — e quando se materializou viu-se que o elemento mais importante era a reaçom contra um problema que está à vista de qualquer pessoa: a desgaleguizaçom maciça e sistemática das crianças no sistema estatal de ensino. E, ademais, também sabíamos que todas — absolutamente todas — as naçons sem Estado na Europa tinham tentado essa via cinquenta, sessenta ou setenta anos antes de nós. Portanto, era um caminho que todo o mundo entendia que devíamos explorar. 

Esta foi a razom inicial. Mas, como é claro, umha vez que se decide abrir umha escola de imersom com um objetivo linguístico, evidencia-se que há que atender também outras cousas e que há que enchê-la com valores. Nom serve só com definir a língua veicular. E está claro que, nesse ponto, a ideologia do grupo promotor inicial tivo a ver com estes elementos que comentas, e que hoje estám intrinsecamente ligados ao projecto. Hoje nom faria sentido promover umha Semente que fosse de outra maneira. 

Quanto à língua, o projecto Semente nom só a coloca no centro do tabuleiro. Fai-no com umha visom mui concreta da mesma: a do reintegracionismo. 

É que as pessoas que tinham claro que um sistema educativo nacional é um elemento indispensável — nom o único, mas sim indispensável — para poder contribuir para a sobrevivência do idioma, também tinham claro que nom ia ser nada simples construir um modelo imersivo em galego sem umha óptica reintegracionista, por questons práticas — de materiais, de músicas, de elementos didácticos — e também porque é o elemento que pode dotar dumha maior autoestima e dumha maior utilidade à própria língua. 

É verdade que a Semente nom estabelece em nenhures umha norma de uso, mas sim que segue a filosofia reintegracionista. Isto significa que se garante que as crianças que entram no projecto estarám em contacto com diferentes maneiras de escrever e falar a nossa língua, e isso respeitando o ritmo de cada criança e de cada um dos grupos que se constituem. De facto, nom todos os grupos promotores da Semente tivêrom a questom linguística tam clara, de maneira que o que se garante — e já nom é pouco — é o contacto com as diferentes variantes da língua através de contos, música, modelos de escrita, etc. Isto tendo em conta que até agora, no período educativo em que se trabalha, a questom da lecto-escrita tampouco está no currículo. No primário, a escolha do padrom já terá outra dimensom, porque haverá que formar as crianças, quando menos, em dous modelos ortográficos. 

Antes comentavas o que se tinha feito noutros países em relaçom a criar escolas nacionais, e a Semente já tem declarado que o seu objetivo é conformar, no meio prazo, uma Escola Nacional Galega. É factível à margem da administraçom pública? Ou, por outro lado, há vontade de que seja precisamente assim? 

Mais bem é que nom hai mais remédio. A maioria das pessoas que estamos na Semente trabalhamos no ensino público estatal, figemos parte dos movimentos de defesa del ou saímos à rua a manifestar-nos por ele, assim que nom hai dúvida nengumha de que a vontade destas pessoas seria que no nosso país as condiçons políticas fossem outras e que os direitos linguísticos das crianças galegas estivessem garantidos. Mas depois de quase setenta anos de políticas linguísticas nefastas que praticamente nos levárom ao extermínio como comunidade linguística, penso que já nem serquer hai tempo de determinados debates. Entrar na dicotomia de se hai que apoiar ou nom o ensino público, entendemos que o que provoca é umha parálise do crescimento de iniciativas populares. Simplesmente, agora mesmo é a única saída, e foi tomada por um grupo de pessoas, na sua maioria activistas, para, quando menos, conter o etnocídio. Conhecemos o modelo das ikastolas, que chegou a tornar-se público precisamente pola pressom que a comunidade criada arredor delas exerceu, e parece-nos umha saída mui interessante. Oxalá nós tivéssemos essa capacidade para provocar umha mudança no rumo da política educativa institucional, mas polo momento somos aínda umha comunidade pequena, e a única opçom que temos é procurar umha saída para um problema que nom é particular, mas de todo o povo. Em qualquer caso, as Sementes nom som umha medida novidosa nem no conjunto de Europa, como digemos, nem na Galiza, onde hai dúzias de exemplos de iniciativas autogeridas e populares impulsadas por diferentes grupos sociais em diferentes momentos para solucionar problemas colectivos. 

Sobre isto que comentas, umha das reticências mais comentadas é sobre a questom de se é ensino público ou privado. Que é? Ou é umha terceira via?

É que no nosso país nunca se chamou “privado” a iniciativas como os jogos desportivos, os economatos, os sindicatos ou as associaçons culturais, que também tenhem actividades formativas. Sempre se lhes chamou iniciativas populares ou comunitarias que, de maneira colectiva, o nosso povo organizou para suprir carências ou negligências do Estado. Aqui nom hai nengum tipo de lucro por parte de ninguém. Trata-se só de que umha parte do nosso povo decidiu tomar as rédeas dum problema e procurar-lhe umha soluçom, com mais ou menos sucesso. E, em qualquer caso, é umha opçom como as que já se ensaiárom no nosso país historicamente: os emigrantes construírom escolas de indianos, as Irmandades da Fala promovêrom escolas de ensino galego, etc. Nós, simplesmente, sentimo-nos herdeiras desse legado. E, em linha com a filosofia do reintegracionismo, nom se trata de inventar nada, mas simplesmente de retomar o nosso próprio discurso histórico e tentar acabar o que, por diferentes circunstâncias, outros nom foram capazes de concluir. A nossa intençom, portanto, nom é outra que assumir a semântica dos movimentos populares.

Outra das questons apontadas habitualmente é sobre os limites do projecto. Nom é só que geograficamente deva desenvolver-se muito mais para ter uma incidência social real. Também cumpre fazê-lo em relaçom com a faixa etária. Como vai a expansom para o primário? 

Sobre a questom do primário, a realidade é que todos os passos legais estám já dados para começar o primário no início oficial do ano escolar em Setembro. Em Trasancos e Compostela estamos unicamente à espera de receber o certificado final, de maneira iminente. De resto, a verdade é que o projecto foi crescendo em oferta à medida que também foi crescendo em massa social e em capacidades. Digamos que a construçom vai em funçom das nossas possibilidades, e nom dos nossos desejos. O objetivo é completar o sistema educativo nacional com todas as etapas formativas, até ao universitário, e também, evidentemente, elaborar um currículo que se adapte às nossas características e necessidades como povo. Agora, por questons óbvias, sobretudo de capacidade económica, vai-se devagarinho, e hai que entendê-lo como umha das limitaçons da autogestom. 

Por último, qual é a situaçom dos apoios e qual é a perspectiva?

Em Trasancos e Lugo, as Sementes estám instaladas em locais que som municipais, e onde os serviços associados a eles são pagos polo concelho. Mas no resto nom há nada, nem sequer em Compostela, apesar de aparecer especificado no programa do governo actual. De qualquer maneira, o nacionalismo — entendido como se queira — deveria apoiar de maneira incondicional umha estratégia como a da Semente. Nom podemos continuar teimando na mesma estratégia de política linguística década trás década, limitando-nos a campanhas de promoçom que contrastam, ano a ano, com cifras cada vez piores. Desde a nossa comunidade escolar nom se compreende mui bem esse cepticismo e desconfiança que percebemos por parte do conjunto do nacionalismo. A Semente é umha peça dentro do movimento de construçom nacional, e nom faria sentido se nom houvesse outras peças. Nom fai sentido criar um infantário se, depois, as crianças nom tenhem outros referentes “adultos” onde se desenvolverem, se nom hai mais espaços onde socializar, onde fazer activismo ou onde fazer política. A Semente tem que fazer parte dum movimento mais completo. Eu, pessoalmente, só vejo que a Semente poda vir a transformar-se num elemento basilar se esse movimento em conjunto entende que isto é fundamental para a nossa ré-construçom como povo. Outros povos tivérom claro que o educativo era um âmbito mui importante. É claro que nom garante nada por si próprio, mas é umha peça essencial nom só a nível linguístico, também para a identidade e o sentimento de pertença. Em qualquer caso, toda a nossa comunidade é mui optimista. Em Trasancos estám a organizar avais para comprar umha propiedade para o futuro, e em Compostela também está isso acima da mesa, o que demonstra que a há umha comunidade que continuar e crescer.

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